“O PS é um partido
que não adota as más práticas estalinistas de eliminação da fotografia deste ou
daquele. O PS assume a sua história.” disse António Costa. Os socialistas não
enjeitam o seu passado, portanto. O problema é que rejeitam o futuro. Um
congresso inteirinho, um santo fim-de-semana, em que o máximo da inovação foi
uma cláusula de salvaguarda para que o aumento do IMI continue a ser limitado?
Não pode ser. Onde está o combate ao desemprego e o crescimento económico? E onde estão as
medidas contra a corrupção? Sim, essas mesmas, até porque o sentimento popular
é que esse combate deve ser prioritário. E ou se atende a esse sentimento ou se
é ultrapassado por ele. O PSD já percebeu e, com a maior cara de pau,
independentemente de Duarte Lima, avançou com propostas. O PS, embaraçado com Sócrates,
negligencia esse espaço político, o grosso das próximas eleições. Vai sair mal
na fotografia.
segunda-feira, 1 de dezembro de 2014
domingo, 30 de novembro de 2014
Acto falhado
A sala
estava meia vazia, as palmas foram sempre a meio gás, as palavras projetadas
com meia convicção. Os semblantes mostravam-se ora ausentes ora estafados.
Enfim, o Partido Socialista gastou tanta energia para evitar que Sócrates fosse
o centro que ficou completamente esgotado. E já não sobrou força para o próprio congresso. Objetivo meio cumprido,
portanto. Tanto esforço para recalcar um tema que depois só pode sair um acto
falhado. O problema é que talvez seja este o futuro próximo do PS. Se Sócrates teimar
no “se for ao fundo, levo o PS comigo”, na defesa na praça pública, o Largo do
Rato poderá ter que gastar grande parte dos seus recursos na contenção desses
danos, na gestão desses riscos, pouco restando depois para as ideias, a
oposição, as eleições e, sobretudo, o país. No sábado de manhã talvez o PS
achasse que bastava escolher “Sócrates ou o partido”. Ao final do dia, entendeu
que eliminar a primeira a opção é, em si mesmo, todo um programa.
Publicado no Correio da Manhã
sábado, 29 de novembro de 2014
Elefante Feroz
A família decidiu organizar uma grande festa
para celebrar o retorno do menino de ouro, depois de uma travessia no deserto. Bonito.
O problema foi que, a uma semana do baile, rebentou o escândalo: o de ouro foi
acusado de muito mau comportamento. Que ironia. Pretendia-se comemorar o seu
regresso. Mas não era bem esse tipo de regresso que se pretendia. Portanto,
agora, o chefe de família gostaria que a conversa fosse outra e que tudo
parecesse normal. “Vá, está quase a chegar a tia Mimi. Comportem-se, digam
sempre muito obrigado e não falem de política”. Mas o filho pródigo e o
patriarca decidiram, pelo contrário, continuar a polémica com os convidados,
mantendo o embaraço vivo, deixando os
familiares e visitas a murmurar, aos pares e aos trios, encolhidos na cozinha e
pelos corredores. Aliás, no meio da sala só restou o elefante. Com um ar feroz.
quinta-feira, 27 de novembro de 2014
“À
justiça o que é da justiça, à política o que é da política”- esta tem sido uma
das frases mais repetidas. Pateticamente. Se estão preocupados com a separação
de poderes, digam: “À política o que é da política. Ao poder económico o que é
do poder económico.” Explico. Mal Sócrates foi preso começou o ataque à justiça,
como se o problema fosse esse e não o facto extraordinário de existir um ex-PM
acusado de corrupção e branqueamento de capitais. E isto é que é o coração da
discussão.
Isso e como o Estado se fundiu com os privados,
sendo que o nosso dinheiro e recursos foram capturados por uma pequena dinastia
partidária e empresarial consanguínea. A mesma que nunca fez nem fará do combate
à corrupção uma prioridade. Ou seja, a questão, depois do BPN, BPP, BES, PPP’s,
swaps, vistos Gold, Sócrates e o mais que está para vir (há mais), é como
evitar maior subversão do regime democrático e estancar a violação do artigo
80º da Constituição - o poder económico deve subordinar-se ao poder político. O
resto é conversa. Ou fraude e branqueamento da verdade.
Publicado no Correio da Manhã
terça-feira, 18 de novembro de 2014
VENDER A ALMA
Existem os vistos
de ouro e existem os que foram vistos vivos pela última vez apinhados numa
casca de noz a tentar atravessar o mediterrâneo. Mar que é hoje um imenso
túmulo da esperança. Como é possível que o Estado assuma, na nossa cara e sem
pinga de vergonha, que prefere dar direitos a quem quer branquear capital do
que a quem quer trabalhar?
É possível porque
estes “passaportes” mostram o que a casta dona-disto-tudo pensa da democracia e
da nação– não valem nada quando comparadas com a nota. Sobretudo, os vistos
dourados são a demonstração última que a corrupção não é um problema de um
punhado de boys gananciosos mas que é sistémica. Afinal, só se vende
nacionalidade e cidadania, só se mercadejam direitos e preferem-se os do
dinheiro aos humanos, quando a corrupção é um aspecto essencial do sistema,
ajuda a que ele se mantenha e não uma vertigem de quem chegou ao topo. Isto é,
a corrupção não é um cancro que metastiza este regime. A corrupção é a rede
que o sustém. O resto é apenas espuma dos dias e o silêncio não de ouro de um
presidente.
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